21 de novembro de 2015

Os "pros e cons" da Lei de Direito de Resposta

Há pouco mais de dois anos, escrevi para o site "Observatório da Imprensa" a respeito da iniciativa do senador Roberto Requião em criar no País uma lei para regulamentar a atuação da imprensa por meio do Direito de Resposta (Projeto de Lei 141). Minhas considerações, daquela época, podem ser conhecidas nesse link do artigo, aqui. A principal das minhas preocupações era a de que a PL 141 trazia em seu bojo um endurecimento da vetusta Lei de Imprensa, de 1967, abolida pelo ministro do STF, Ayres Brito, em 2009.

Pois em novembro deste ano, o Congresso Nacional aprovou a PL 141 e a presidente Dilma Rousseff assinou a criação da Lei do Direito de Resposta, que regulamenta o inciso V do Artigo 5° da CF 1988. Houve apenas um veto sobre a necessidade de o suposto ofendido ter acesso aos meios de comunicação para apresentar ele próprio o seu argumento contraditório. Dilma foi duramente criticada pelo autor do projeto de lei sobre este veto.

Para mim, a presidente acertou muito mais do que errou. A imprensa não tem nenhuma condição de trabalhar com liberdade diante da ameaça de ser retaliada pelas pessoas que se sentem ofendidas quando são alvos de sua atenção. O subjetivismo da Lei de Direito de Resposta garante a voz tanto a quem de fato merece quanto para quem não merece ser beneficiado pela nova legislação. É evidente que o primeiro resultado disso é a autocensura, considerada como a pior das censuras, torturante, porque inibe além de direitos individuais, direitos humanos.

Por ser este Congresso Nacional o mais reacionário de todos os tempos da república brasileira, a desconfiança ou suspeita inicial é que a Lei vai ser usada muito mais por picaretas pretensamente ofendidos do que por pessoas verdadeiramente ofendidas. Como disse, o critério é totalmente subjetivo, assim como será a decisão a ser tomada, quando solicitada, por um magistrado. Porém, este artigo não tem o objetivo de fazer a exegese da Lei de Direito de Resposta, mas avaliar por meio de um exemplo os prós e contras da nova legislação.

O caso aqui foi estampado em jornal diário impresso, no dia 16 de novembro, e teve resposta publicada no dia 18 de novembro. Nota-se que o contraditório obedeceu os critérios da Lei do Direito de Resposta em termos gerais, nos requisitos de proporcionalidade e de espaço ocupado na página. Há alguma diferença de cores nas fontes usadas e de tamanho do box, mas é possível verificar que a publicação buscou atender à nova legislação. Não tenho conhecimento se o ofendido ficou satisfeito com a resposta ou se ele pretende processar o jornal, o que a Lei de Direito de Resposta lhe garante.

16.11.2015 - Notícia: estampa acusação

18.11.2015 - Resposta: explica comportamento

O jornal publicou em posição de destaque, na primeira página, uma ofensa clara contra o promotor. A manchete sintetiza a opinião do advogado de defesa de um padre goiano denunciado por não prestar serviços, mas receber como funcionário da Assembleia Legislativa de Goiás, durante 20 anos. Para o promotor, o caso é clássico e escandaloso como exemplo de "funcionário fantasma". Para o advogado, entre outras suposições, o promotor demonstra intolerância religiosa ao ignorar que o padre prestava serviços externos à comunidade e não havia necessidade de bater ponto nos horários de expediente.

Nesse contexto, eis que o editor da primeira página do jornal cravou no destaque: "KREBS - O promotor da ignorância". Apesar dessa ser a opinião exclusiva do advogado, ao ser transformada em manchete de primeira página, o jornal assumiu o risco e a cumplicidade de propagar a difamação pública do promotor. Assim, o fator editorial acabou transformando depoimento dado em entrevista no interior do jornal em uma verdadeira injúria. Difamação e injúria são crimes contra a honra previstos no Código Penal, nos artigos 139 e 140, respectivamente.

Fica a pergunta à Justiça, que me desperta pulgas atrás das orelhas: "Como será possível para um juiz decidir se houve intenção do jornal em prejudicar a imagem do promotor ou se o jornal apenas exerceu seu direito de liberdade de imprensa?" Ora, se o juiz disser que o jornal colaborou em denegrir a imagem do ofendido, ele responderá solidariamente. Por outro lado, se o juiz julgar que o jornal atuou apenas como veículo de comunicação, dando conhecimento a uma opinião alheia, nada sucederá como crime. 

No geral, avaliando-se o primeiro caso acima, a decisão do juiz vai ampliar o alcance da Lei de Direito de Resposta, impactando diretamente os veículos de comunicação, gerando o famoso clima de censura e autocensura. Já no caso de o juiz garantir a liberdade de imprensa, o Direito de Resposta terá metade de seu efeito, visto que não vai contribuir para um aperfeiçoamento do exercício profissional da imprensa e o cumprimento de sua função social, que é dar voz ao cidadão (nesta caso, o advogado do padre). 

Em resumo, acredito que se pode afirmar que a Lei de Direito de Resposta vai contribuir, no mínimo, para uma escalada de processos de opinião e o achaque de canais de comunicação, sejam eles os tradicionais impressos e televisionados, ou os modernos veículos do campo das chamadas mídias sociais. Para um veículo de comunicação que é estruturado e pode contar com advogados, a briga na Justiça será longa e dura. Para o cidadão comum que tem um blog, a luta será totalmente desigual. Já está perdida, de chofre. 

Após essas considerações, tento eleger abaixo os prós e os contras da Lei de Direito de Resposta:

PRÓS E CONTRAS DA LEI DE DIREITO DE RESPOSTA

                  PRÓS                                                             CONTRAS
- Regulamenta artigo da CF/88            - Inadequação à realidade das novas mídias
- Disciplina parte da imprensa             - Punição gera censura e autocensura
- Garante voz ao contraditório              - Má fé vai confundir público
- Prevê agilidade na aplicação              - Redução da credibilidade da imprensa
- Amplia direitos dos cidadãos             - Pode beneficiar mais bandidos que honestos

20 de novembro de 2015

A vez da reinvenção das escolas na Era Social

Assim como os jornais e revistas impressos estão fadados ao desaparecimento, as escolas tradicionais também estão. O modelo atual pertence ao milênio passado: é burocrático e na esmagadora maioria dos casos se transformou em mero depósito de jovens, o que não estimula em nada a cidadania. O modelo atual de educação ainda é aquele opressor da criatividade, baseado na castração de sonhos e na fabricação de profissionais que vão supostamente ocupar uma vaga no mercado de trabalho. É um modelo que serve à manutenção do status quo e à reprodução de mecanismos de desigualdade social.
O sentido teleológico da educação é conscientizar o ser humano de suas limitações, mas, sobretudo, de suas potencialidades. As Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) destruíram as paredes da escola tradicional, oferecendo informação e conhecimento que devem ser direcionados para o seu melhor aproveitamento. Vem dessa característica os estudos e tentativas de individualizar o ensino e aprendizagem por meio de algorítimos que contribuam para personalizar a capacidade de aquisição de conhecimento.
Já saímos da Era da Informação, em que o pensamento era guiado pela lógica binária dos computadores. Ao juntar hardware, software, telecomunicações e capital humano, chegamos à Era Social, em que a colaboração e o compartilhamento de informações e conhecimento são os fundamentos para a formação do cidadão global. Nesse novo contexto, a escola tradicional deve dar lugar a outra escola muito mais adequada a esta realidade.
Não só as escolas de ensino fundamental e médio se fecharam como feudos no sentido de não serem democráticas, as próprias universidades ergueram seus muros para se proteger de alguma forma contra os efeitos (e defeitos) das TICs. O novo cenário exige que o papel do professor seja revitalizado, ampliado e, principalmente, valorizado. Se o conhecimento ou experiências de sala de aula são compartilháveis, não se trata de atender os anseios dos alunos em classe e ou de seus pais. Trata-se de corresponder aos anseios de toda a sociedade, das comunidades local, regional, nacional e internacional!
Entre outras, considero que prioritariamente as razões de ser da escola moderna são as de promover ativamente as democratizações da comunicação e da inovação. Democratizar a comunicação significa dar voz ao cidadão, o que fortalece as relações da escola com a comunidade e estimula a cidadania e o bem-estar da sociedade. Democratizar a inovação significa fomentar a criatividade, criar e cocriar objetos ou recursos educacionais, desde informações, notícias, infográficos até produtos audiovisuais, aplicativos e multiplataformas multimídia de gestão de conteúdos, aprendizagem e recursos humanos.
O Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM) avançou demais nesse sentido da avaliação de competências. Mais do que as escolas e faculdades avançaram. A maior parte das competências de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias dizem respeito ao contexto da Era Social e TICs. O ENEM reforça o apelo à essa nova realidade, quando estima que os candidatos tenham habilidades não só cognitivas, mas também socioemocionais. Porém, são pouquíssimas as ações afirmativas governamentais promovidas para equacionar essa questão. É a escola que tem o dever de se reinventar. Na Era Social, as condições para que isso aconteça são as melhores possíveis. É assim que será possível criar condições de mudanças realmente democráticas.