Se você é daqueles que acredita
que o mensalão PSDB-MG é igual ao esquema financeiro da AP 470 pode
despedir-se de mais uma ilusão.
A leitura das
alegações finais de Rodrigo Janot, procurador geral da República sobre o
mensalão PSDB-MG mostra uma verdade difícil de negar. Tudo aquilo que
se disse – e não se provou – sobre o esquema de Valério-Delúbio pode ser
dito e provado no mensalão PSDB-MG.
A polêmica
principal sobre o mensalão dos petistas diz respeito ao desvio de
recursos públicos. O procurador geral Antônio Carlos Fernando, seu
sucessor Roberto Gurgel e o relator Joaquim Barbosa sustentam, desde o
início, que o esquema Valubio baseou-se no desvio de R$ 73,8 milhões de
recursos públicos. Dizia-se, no começo, que esse dinheiro fora desviado
do Banco do Brasil. Uma apuração mais acurada mostrou que o dinheiro
pertencia ao Fundo de Incentivo Visanet, destinado a divulgar o cartão
Visa, que é uma empresa privada. Hoje não há a mais leve dúvida a
respeito.
Embora uma única testemunha
tivesse dito que – qualquer que fosse sua natureza -- os recursos
destinados a DNA eram desviados para campanhas petistas, a contabilidade
mostra que o desvio – se houve – está longe de ter sido demonstrado.
As contas batem, conforme várias auditorias.
E tanto é assim que
nesta semana, teremos uma novidade neste item. Enquanto os réus da AP
470 já estão cumprindo penas longas, em regime fechado, seus advogados
começam a distribuir uma notificação judicial aos veículos que receberam
as verbas da DNA. Estamos falando da TV Globo, Editora Abril, Estadão,
Folha, Editora Três.
Convencidos de que
irão colher um dado que ajudará a demonstrar a inocência dos réus, os
advogados querem que as empresas confirmem – ou desmintam – a
informação de que os recursos da DNA chegaram a seus cofres. Estes
dados, a rigor, encontram-se nos documentos da AP 470. Mas ficaram ali,
congelados nos arquivos, sem que fosse possível examinar seu significado
e extrair todas implicações.
A consulta às
empresas, que será feita agora, deveria ter ocorrido em 2005 ou 2006,
na época da denúncia. Era o tempo certo para uma checagem tão
importante, decisiva, até.
Mas não interessava questionar uma teoria que agradava tantas pessoas e tantos interesses, vamos combinar.
A leitura das
alegações finais de Janot sobre o mensalão do PSDB descreve fatos muito
mais graves. Ele fala de desvio de milhões de reais de empresas estatais
do governo de Minas Gerais. Fala da Copasa, Codemig, Comig. Ao
contrário do que acontecia com a Visanet, que se definia como “empresa
de capital privado”, em seus estatutos e também num questionário enviado
a CPMI dos Correios, aqui estamos falando de empresas públicas,
controladas pelo governo do Estado, com funcionários concursados e tudo
mais.
A Copasa é a
Companhia de Saneamento do Estado. A Codemig dedica-se ao
desenvolvimento econômico e obras de infraestrutura. A Comig é a estatal
de mineração.
Não há comparação possível com a Visanet, criada pela multinacional dos cartões Visa, uma das maiores empresas do mundo.
Com notas e
depoimentos, Janot descreve cenas tão didáticas que poderiam estar num
filme. O dinheiro sai das estatais, chega às agências e, em vez de ser
gasto em publicidade, é despachado para os cofres da campanha estadual
do PSDB em 1998. Porções mínimas das verbas destinadas a publicidade
chegaram a seu destino. A maior parte ficou no meio do caminho, diz ele.
Muitas pessoas
diziam, quando Roberto Jefferson fez a denúncia, que o PT apenas repetia
o que o PSDB fizera antes. O próprio Lula disse em Paris que seu
partido nada fazia de diferente daquilo que ocorria “sistematicamente”
na política brasileira.
Parecia uma forma
do PT tentar proteger-se atrás dos erros do adversário, o que levou a
acusação de que o partido queria justificar seus erros através dos erros
dos outros. Talvez seja mais correto afirmar o contrário. A construção
de uma visão distorcida na AP 470 ajudou a encobrir erros e desvios --
mais graves -- da AP 536-MG.
Embora o próprio
Janot se permita, nas alegações finais, lembrar as semelhanças – e
algumas distinções – entre os dois mensalões, as diferenças são muito
maiores do que se quer acreditar. O Banco Rural é o mesmo, um
personagem central – Valério – também. Até as secretarias eram as
mesmas.
Mudava a natureza da mercadoria.
A existência do
mensalão PSDB-MG chegou ao STF Supremo em 2003 mas ficou em segredo até a
denúncia de Roberto Jefferson contra o PT. Foi então que se descobriu
que Marcos Valério, o parceiro que se aproximou de Delubio – o
Carequinha, nas palavras de Jefferson -- nos meses finais da campanha de
2002, havia sido formado e treinado nas campanhas tucanas desde 1998.
Veio daí a teoria
de que o segundo mensalão era uma cópia do primeiro. As diferenças no
ponto essencial – dinheiro público – permitem pensar em outra hipótese. A
teoria do segundo mensalão serviu para justificar o primeiro.
É como se, já tendo
conhecimento anterior do mensalão PSDB-MG, a acusação tenha feito o
possível para vestir o esquema de Delúbio-Valério com as mesmas
roupagens e a mesma gravidade, fazendo uma denúncia igual para casos
substancialmente diferentes. Isso explica porque se forçou a barra para
dizer que as verbas saiam do Banco do Brasil e, quando se verificou que
sua origem era a Visanet, para dizer, num exercício espantoso, aque os
recursos seguiam publicos embora fossem propriedade de uma empresa
privada.
FONTE: http://www.istoe.com.br/colunas-e-blogs/coluna/347201_MENSALOES+DIFERENTES